A remoção das famílias

A remoção das famílias

Por: Liana Becocci / Folha do Condomínio

As fortes chuvas que atingiram o Rio de Janeiro nas últimas semanas revelaram o quanto pode custar a omissão dos governos em relação à ocupação desordenada do solo. O problema não é exclusividade do Estado fluminense. Construções irregulares (tanto casas populares como de classe média alta), muitas localizadas em áreas de risco ou de proteção ambiental, são parte da paisagem urbana em todas as regiões brasileiras.

São Paulo, a principal metrópole do país, tem cerca de 16% da sua população residindo em loteamentos informais, segundo levantamento da Fundação Seade de 2008. São mais de 1,7 milhão de pessoas, quase o mesmo que a população de capitais como Porto Alegre, Curitiba, Recife e Manaus, onde o problema também existe e é grave.

Como em episódios semelhantes, as autoridades públicas do Rio de Janeiro anunciaram planos ambiciosos de remoção das famílias que vivem nas áreas condenadas. A tarefa não será fácil, e os governantes têm consciência disso, tanto que costumam evitar essa ação por considerá-la impopular.

Tensões sociais podem, de fato, decorrer do deslocamento de pessoas, assim como a perda dos vínculos comunitários estabelecidos, do emprego e dos bens culturais. No entanto, esses impactos negativos podem ser mitigados, por meio de acompanhamento social eficaz e de processos que garantam a participação efetiva da comunidade. É o chamado gerenciamento social, que busca assegurar a remoção com dignidade.

A experiência confirma que a contrapartida do reassentamento realizado nessas bases compensa os possíveis custos, sejam eles sociais ou políticos. Os benefícios primeiros são a melhoria da qualidade de vida daquela população do ponto de vista das condições de habitabilidade; a regularização jurídica da situação das famílias, permitindo uma inserção social ampla, principalmente quando o deslocamento é acompanhado pelo planejamento urbano integral da nova área, com garantias de acesso a serviços de saneamento, transporte, saúde etc.

Outro ponto positivo é a possível geração de trabalho e renda durantes as obras, benefício este que pode ser estendido a comunidades próximas. Todo esse processo cria condições para evitar que novas ocupações clandestinas se estabeleçam.

Após a tragédia do Rio de Janeiro – e de outras que a antecederam, como a do Morro do Baú, em Santa Catarina, e a do Jardim Pantanal, em São Paulo, só para citar algumas das mais recentes – fica claro que o Estado não mais pode ignorar o problema da ocupação irregular. O reassentamento apresenta-se como uma solução imediata viável para a redução da vulnerabilidade social e urbana das vítimas, no entanto, devemos lembrar que a solução definitiva e estrutural para o problema passa por uma gestão eficiente do uso do solo e por políticas sociais mais eficazes.

*Liana Becocci é engenheira e diretora da Ieme Brasil, empresa de engenharia consultiva, com certificação ISO 9001/2000 em Gerenciamento Social e experiência consolidada em inúmeros trabalhos realizados para as prefeituras de São Paulo e Suzano, Dersa (Desenvolvimento Rodoviário), CDHU (Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano), entre outros clientes.